Por Tuca Monteiro
Confesso: adoro estes dias em que sou “obrigada” a ficar cerca de uma hora em uma fila para pagar contas!* Certamente é um momento único! Único porque me permite refletir e ampliar o olhar sobre o que é, de fato, um ambiente que inclui.
E, sendo assim, nada escapa ao meu olhar: de uma porta de acesso segregada, pesada e estreita que dificulta a entrada de uma pessoa usuária de cadeira de rodas a um piso tátil que guia uma pessoa cega ao nada, até uma placa informando que tal ou qual guichê é prioritário aos “portadores de deficiência física” (sic), quando o correto seria pessoas com deficiência - qualquer pessoa com deficiência e não somente as pessoas com deficiência física -; caixas eletrônicos e guichês de atendimento inacessíveis, mas que possuem o Símbolo Internacional de Acesso (SIA)!
E foi exatamente em um desses guichês acessíveis que presenciei, no dia 02.03.10 por volta das 14:30 hs na agência do banco Bradesco na rua Visconde de Inhaúma em São Caetano do Sul, a dificuldade em que uma senhora usuária de cadeiras de rodas teve para assinar documentos. O guichê até que estava com a altura estabelecida pela norma técnica NBR 9050-04 – a altura para se atender uma pessoa sentada (0.85cm - no momento não tenho como dizer se esta altura atende as necessidades de pessoas com tetraplegia cujas cadeiras são mais altas do que as usadas por pessoas com paraplegia) -, mas a largura da bancada de 15cm fora insuficiente para permitir a aproximação da senhora como ilustra a imagem abaixo (projeção de 0.15cm):
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Agência banco Bradesco - não fora possível registrar o momento em que a senhora utilizava o guichê. |
Foi um corre-corre do atendente para encontrar algo que pudesse servir de apoio. Depois de alguns minutos - e neste ínterim a fila aumentara consideravelmente - surge o rapaz com um suporte para armazenar papeis; de pronto o colocara no colo da senhora que, com um gesto rápido e um sorriso no rosto, assinara os documentos. E eu me contorcendo de indignação!
Quando enfim chegara a vez de sermos atendidos (eu estava acompanhando uma pessoa com deficiência) dissemos ao atendente que deveriam retirar o símbolo de local acessível do guichê, já que o mesmo demonstrara não atender as necessidades das pessoas. Foi então que o rapaz dissera que o problema não era o guichê e sim o fato da senhora, devido ao seu “problema” (sic), não conseguir lançar o tronco para frente. Naturalmente que não ficamos surpresos com tal declaração, o rapaz apenas explicitou o modo como a sociedade enxerga a condição do outro: a do ser atípico, que deve se adaptar as situações já sedimentadas.
Esse conceito de que é a pessoa “diferente” (fora do padrão) que deve se adaptar ao ambiente; ou seja, é a senhora usuária de cadeira de rodas que deve encontrar meios para utilizar o guichê da agência bancária, denomina-se integração. Há pelo menos duas décadas este conceito está sendo combatido pelos movimentos que lutam pela inclusão das pessoas com deficiência neste país, pois o conceito de inclusão é a superação do conceito da integração: é o ambiente que deve se adequar à necessidade das pessoas.
Em um outro dia voltei à agência com o intuito de verificar as dimensões do guichê, ao colocar a trena sobre o tampo qual não fora a minha surpresa ao notar que o mesmo era articulável!
Sim pessoas eu estava diante de uma raridade: um guichê acessível cujo tampo se ajustava conforme a necessidade do usuário, chegando a largura total de 0.45cm!
Por que o atendente percorreu toda a agência atrás de um objeto que pudesse servir de apoio se bastava deslizar o tempo para frente? Será que o atendente não sabia que o tampo do guichê era articulável ou será que sabia, porém não fazia ideia de sua utilidade?
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Imagem extraída do Manual de Acessibilidade para Agência Bancária da FEBRABAN com as dimensões indicada pela norma ABNT 9050-04 cuja largura mínima admíssivel é de 30cm. |
*Em São Caetano do Sul há a lei 4949-07 que regula o tempo de espera: quinze minutos em dias normais e trinta minutos em véspera ou em dia seguinte a feriados; e em datas de vencimento de tributos e contas de concessionárias de serviços públicos. Contudo, para o banco Bradesco, essa lei não existe!