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São Caetano do Sul, Região do ABCD /São Paulo, Brazil
Não sabemos o que somos e sim o que NÃO somos! Não somos uma organização não governamental sem fins e muito menos com fins lucrativos (ONGs); Não somos um INSTITUTO; Não somos uma INSTITUIÇÃO nem pertencemos a uma; Não somos de CONSELHOS nem representamos segmentos. Não defendemos bandeiras PARTIDÁRIAS. Sendo assim, somos ILEGÍTIMOS aos olhos dos Poderes Constituídos!

Diálogos, História, CENSO, Teleton e MacDiaFeliz

Postado em 29.11.2010.

                    Por Amilcar Zanelatto Fernandes                                          


 Censo Insensato

O Brasil coleta dados sobre pessoas com deficiência desde 1872, porém de forma precária e centrada apenas nos aspectos físicos. De 1920 até 1940, o censo inclui algumas categorias mentais (sic) advindas do Congresso de Londres. Já a partir da década de 1980, por pressão de organizações de pessoas com deficiência, se tornam obrigatórias perguntas que apurem com mais precisão dados sobre o segmento. Entretanto, a Lei 7853/89 mantém a obrigatoriedade somente de perguntas referentes a características físicas e intelectuais. O censo de 1991 mantém a mesma formatação.

O censo de 2000, por recomendação da OMS (Organização Mundial de Saúde), passa a adotar o CIF (Código Internacional de Funcionalidades) como inspiradora a formulação das perguntas, referenciando-se por um modelo social. Esse novo critério apurou que, no censo 2000, 14,5% (24,1 milhões entre 166 milhões) das pessoas declararam ter algum tipo de deficiência. Em 1991, foram apuradas 1,41% (2,07 milhões entre 146 milhões). Um aumento nominal de 1063%!!!

Então, podemos afirmar que há precisão nesses dados, não?

Não.

Por que?

Porque esses dados foram colhidos por amostragem.

Pelo critério de amostragem, em um de cada cinco domicílios é aplicado o questionário para verificação de existência de pessoa com deficiência.

Além disso, as questões estão elaboradas de forma tal que suscitam dúvidas quanto à precisão estatísticas dos resultados.


Vejamos o questionário do Censo 2000, encontrável no endereço http://www.ibge.gov.br/censo/quest_amostra.pdf :





4.10 - TEM ALGUMA DEFICIÊNCIA MENTAL (sic) PERMANENTE QUE LIMITE AS SUAS ATIVIDADES HABITUAIS?
(Como trabalhar, ir à escola, brincar, etc.)
1 - SIM                                                                      2 - NÃO

4.11 - COMO AVALIA A SUA CAPACIDADE DE ENXERGAR? (Se utiliza óculos ou lentes de contato, faça sua avaliação quando os estiver utilizando)
1 – INCAPAZ             2 - GRANDE DIFICULDADE PERMANENTE
3 - ALGUMA DIFICULDADE PERMANENTE          4 - NENHUMA DIFICULDADE

4.12 - COMO AVALIA A SUA CAPACIDADE DE OUVIR? (Se utiliza aparelho auditivo, faça sua avaliação quando o estiver utilizando)
1 – INCAPAZ                                                             2 - GRANDE DIFICULDADE PERMANENTE
3 - ALGUMA DIFICULDADE PERMANENTE        4 - NENHUMA DIFICULDADE

4.13 - COMO AVALIA A SUA CAPACIDADE DE CAMINHAR/SUBIR ESCADAS?(Se utiliza prótese, bengala ou aparelho auxiliar, faça sua avaliação quando o estiver utilizando)
1 – INCAPAZ                                                             2 - GRANDE DIFICULDADE PERMANENTE
3 - ALGUMA DIFICULDADE PERMANENTE        4 - NENHUMA DIFICULDADE

4.14 - TEM ALGUMA DAS SEGUINTES DEFICIÊNCIAS: (Assinale somente uma alternativa),
priorizando a ordem apresentada)
1 - PARALISIA PERMANENTE TOTAL                  2 - PARALISIA PERMANENTE DAS PERNAS
3 - PARALISIA PERMANENTE DE UM                  4 - FALTA DE PERNA, BRAÇO, MÃO, PÉ OU   DOS LADOS DO CORPO                                              DEDO POLEGAR

5 - NENHUMA DAS ENUMERADAS.


Na questão 4.10, referente à deficiência metal (sic) (percebem o erro na terminologia? Não há deficiência mental; há doença mental. E doenças, muitas não são de caráter permanente – porque curáveis -, enquanto que uma deficiência somente é deficiência porque permanente), há duas opções de resposta: sim ou não.

Ora, como aferir “limitações”?

Há graus de severidade limitativa, comparativamente ao meio, em qualquer tipo de deficiência.

Não seria mais prático e preciso, portanto, sensato (sem eufemismos) perguntar à pessoa entrevistada:
“Há alguma pessoa com deficiência intelectual?

Se sim, de que tipo (lista de causas de deficiência intelectual, inclusive a opção “desconhecida”)?

Estuda? Qual grau de escolaridade?

Trabalha?

Tem autonomia para as seguintes atividades: alimentação, higiene pessoal, locomoção?

Já nas questões 4.11 a 4.13 verificamos que, se a pessoa entrevistada utilizar prótese ou órtese e declarar o item 4 (nenhuma dificuldade), ela passa a não ter deficiência. É isso?

A questão 4.14, por seu turno, considera apenas a existência de hemiplegia, paraplegia, tetraplegia e amputação. Esqueceram-se, os(as) elaboradores(as), que existem atrofias também, como no meu caso: atrofia de membros superiores causada pela Síndrome da Talidomida.

Independentemente disso, o IBGE divulgou os seguintes dados básicos apurados em 2000:

Censo IBGE 2000 - População com Alguma Deficiência.

Mental (sic): 2.848.684

Física:
- Tetraplegia, paraplegia ou hemiplegia : 955.287
- Falta de membro ou de parte dele: 466.936
TOTAL: 1.422.223

Motora:
- Incapaz de caminhar ou subir escada: 588.201
- Grande dificuldade permanente de caminhar ou subir escada: 1.799.917
- Alguma dificuldade permanente de caminhar ou subir escada: 5.491.482
TOTAL: 7.879.600

Auditiva:
- Incapaz de ouvir: 176.067
- Grande dificuldade permanente de ouvir: 860.889
- Alguma dificuldade permanente de ouvir: 4.713.854
TOTAL: 5.750.810

Visual:
- Incapaz de enxergar: 159.824
- Grande dificuldade permanente de enxergar: 2.398.472
- Alguma dificuldade permanente de enxergar: 14.015.641
TOTAL: 16.573.937

Em 2004 eu ainda era filiado ao Partido dos Trabalhadores e um colega de partido, Flavio Henrique, manifestara interesse em se candidatar à vereança no pleito municipal daquele ano, aqui em São Caetano do Sul. Flavio, que é cego, me fora apresentado por Tuca Munhoz, então Coordenador do Setorial Estadual da Pessoa com Deficiência Petista e com quem eu, em 1991, fundara o MID, hoje Instituto MID para Participação Social da Pessoa com Deficiência. Tuca nos apresentara a Cida, socióloga cujo trabalho fora, dentre outras análises, o de “cruzar” dados sobre condições sócio-econômicas e escolaridade de pessoas com deficiência do município de São Caetano do Sul, onde moro. Apurou-se que 10,9% da população de São Caetano declararam ao Censo (por amostragem) 2000 ter algum tipo de deficiência. Destas, em idade escolar (28% da população com deficiência), apenas 24% concluíra o Ensino Fundamental. Da população economicamente ativa, somente 1,4% trabalhavam formalmente. 71% das pessoas com deficiência no município pertenciam a famílias cuja renda não ultrapassava dois salários mínimos.

Munido deste e de outros dados, pesquisei quantas e quais as ações do Poder Público municipal durante o período 2001-2004 em favor do segmento.
  • Não houvera política pública
  • A produção legislativa do período voltada ao segmento somente não fora nula porque um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado com o MP obrigou o Executivo a fazer aprovar a Lei 4207/04 que “INSTITUI O ESTATUTO MUNICIPAL DA PESSOA DEFICIENTE E DO PORTADOR DE NECESSIDADES ESPECIAIS" (sic) (coligido do PL 3638/00, de iniciativa do então deputado Paulo Paim (PT)). E este “estatuto” municipal está repleto de barreira programática.
Gerou-se, então, o seguinte documento:

"INTRODUÇÃO


Da população brasileira, cerca de 14,5% - aproximadamente 24,6 milhões de pessoas – têm algum tipo de deficiência. Em São Caetano do Sul, 10,9% da população declarou ao censo 2000 do IBGE possuir algum tipo de deficiência, sendo que cerca da metade desse percentual apresentam deficiência física ou  mobilidade reduzida, 35% com deficiência sensorial ( visual ou auditiva ) e cerca de 15% com deficiência intelectual.

Sabendo-se da dívida social histórica que os municípios têm para com as pessoas com deficiência, e a consequente falta de qualidade de vida deste segmento, concluímos que uma sociedade que se pretende democrática e humanista, portanto, socialista, deve entender a realidade e as necessidades destas pessoas e, em respeito a elas, instituir políticas específicas a partir de um novo modelo e de uma nova postura, contemplando a participação e reconhecendo o papel protagonista desse segmento nas propostas de ações afirmativas que equiparem oportunidades, reordene e articule as ações do Município na perspectiva de proporcionar uma vida mais digna, com qualidade e, principalmente, autonomia.
Amílcar Zanelatto Fernandes

I – Diagnóstico

I.a – Acessibilidade Arquitetônica
A Lei Municipal 4.207/04 (Estatuto da Pessoa Portadora de Deficiência e de necessidades Especiais(sic)) trata da acessibilidade - sendo seus artigos coligidos da PL 3638/00 e Lei Federal 10.098/00  -; e, no entanto, o Estatuto ainda não foi regulamentado. Não há adaptação de calçadas, com guias rebaixadas conforme norma da ABNT (consideramos a NBR 9050 como referência, apenas. Há falhas que necessitam ser reparadas). Os edifícios públicos e privados necessitam de adaptações, há ausência de continuidade e uso inadequado do Símbolo Internacional de Acesso (SAI).

I.b – Acessibilidade de Comunicação
A Prefeitura não possui um programa de comunicação institucional impresso em Braille, os eventos públicos não contam com tradutores de LIBRAS ( Língua Brasileira de Sinais ) e ainda não implantamos um programa de inclusão digital.

I.c – Transporte
O sistema de transporte coletivo do município conta com alguns ônibus dotados de plataforma elevatória para pessoas com deficiência, mas por falta de um programa integrado de acessibilidade, não atende às nossas necessidades. Há apenas uma perua “Van” para condução de pessoas com deficiência a hospitais públicos ou privados.

I.d – Educação
Não existe na cidade nenhum projeto de inclusão escolar de pessoas com deficiência envolvendo capacitação profissional do corpo docente, agentes escolares, administração escolar, pais e corpo discente. Poucas escolas estão adaptadas conforme a Lei de Acessibilidade. Das pessoas com deficiência do município em idade escolar, 76% não completaram o ensino fundamental.

I.e – Cultura, Esporte e Lazer
Programas esportivos e de lazer voltados para pessoas com deficiência são nulos no município, embora haja uma lei municipal (3.626/98), não regulamentada, que “disciplina a participação de pessoas com deficiência nos jogos regionais no município”. O acervo em Braille é deficitário, abrigado em uma única biblioteca (Vila Gerty); os funcionários não estão capacitados para receberem pessoas com deficiência e não há acessibilidade digital, assim como arquitetônica. Os espetáculos teatrais não contam com tradutores em LIBRAS.

I.f – Saúde
Não existe no município um programa específico de atendimento a pessoas com deficiência, em especial à mulher com deficiência. Não existe um serviço público municipal de habilitação e reabilitação, nem políticas públicas de prevenção de enfermidades que resultam em sequelas.

I.g – Emprego e Renda
O município carece de serviços de capacitação profissional para pessoas com deficiência.
Desconhece-se o número de empresas que possuem mais de 100(cem) funcionários, para a exigência do cumprimento da lei de cotas. Cerca de 98,6% das pessoas com deficiência do município, em idade de trabalho, não estão inseridas no mercado formal e, desse percentual, 76% nunca trabalharam.

I.h – Assistência Social
São Caetano do Sul adota uma incisiva política asssistencialista. Suas principais instituições assistenciais (APAE e Anne Sullivan) têm forte representatividade na Câmara Municipal. A maioria das pessoas com deficiência ou seus familiares por mim abordados nesses meses tem receio de participarem de discussões de seus direitos por acreditarem que possam perder “privilégios”, tais como vaga nas instituições, cadeiras de rodas, cestas básicas, etc..

Esse modelo deve ser insistentemente combatido, pois estabelece uma relação de dependência, impedindo a construção de uma autonomia e o consequente não pertencimento à cidade.

Há um Conselho Municipal da Pessoa Portadora de Deficiência(sic), conforme Lei Municipal 4.096/02 (não regulamentada), não paritária.


II – Propostas

Abaixo estão descritas algumas propostas desse setorial para o segmento:

• Promover a articulação das políticas públicas municipais setoriais, como educação, saúde, transporte, comunicação, ação social, esportes, lazer, cultura e infra-estrutura, entre outras, a fim de que sejam criadas redes de serviços que contemplem uma nova atitude em relação à atenção do município em “promover a cidadania da pessoa com deficiência”, entendendo-se como efetiva sua participação em uma sociedade autônoma ;

• Estimular pesquisas e estudos sobre as causas que originam as deficiências no município, visando a prevenção;

• Estimular pesquisas censitárias e demais estudos da pessoa com deficiência para que o município possa ter um perfil delas, com o objetivo de tornar públicas suas realidades (quantos somos, quais as causa da deficiência, onde estamos, como vivemos, quais os níveis de escolaridade, etc.);

• Assegurar o direito à comunicação e à cultura às pessoas com deficiência visual e auditiva estimulando a produção em Braille, Libras, textos falados, programações legendadas, acessibilidade digital em todas as páginas da administração pública e outros recursos, de forma a garantir a universalização da comunicação, da formação e da informação;

• Garantir o cumprimento da legislação no que diz respeito à acessibilidade, com a eliminação de barreiras físicas, atitudinais e comunicacionais através de adaptações dos espaços, edifícios, meios de transporte, etc;

• Desenvolver ações que estimulem as empresas a adaptarem seus métodos, procedimentos, e equipamentos de trabalho às pessoas com deficiência;

• Cumprir a legislação no que diz respeito à construção de moradias acessíveis as pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida, nos programas de habitação municipal, utilizando o conceito o Desenho Universal;

• Assegurar a participação de pessoas com deficiência em todas as fases do processo de formulação e implementação das políticas públicas para este segmento;

• Fortalecer o Conselho Municipal da Pessoa com Deficiência como instância de formulação, definição e participação popular e democrática da pessoa com deficiência, como a criação do Comitê Municipal de Acessibilidade;

• Promover programas de capacitação dos recursos humanos do município sobre essa nova atitude em relação à pessoa com deficiência."


Como podem perceber, embora o documento acima fora gerado tendo como base dados do Censo 2000, se o Censo trouxesse maior precisão, melhor seria o planejamento para ações concretas ao segmento.

 

Por que, afinal, o IBGE não apura com precisão dados quantitativos e qualitativos do segmento, insistindo no Censo por amostragem?

Por que o Poder Público – mormente em gestões que sustentam o sistema econômico vigente - não se interessa, mesmo com os dados apenas estatísticos, em promover políticas públicas consistentes ao segmento?

É o que analisaremos na próxima postagem, Teleton e MacDiaFeliz.

Mas, antes, convido o(a) leitor(a) a analisar o questionário do Censo (por amostragem) 2010: o que acham?


 




6.14 - TEM DIFICULDADE PERMANENTE DE ENXERGAR?
( SE UTILIZA ÓCULOS OU LENTES DE CONTATO, FAÇA SUA AVALIAÇÃO QUANDO OS ESTIVER UTILIZANDO)
1 - SIM, NÃO CONSEGUE DE MODO ALGUM 3 - SIM, ALGUMA DIFICULDADE
2 - SIM, GRANDE DIFICULDADE 4- NÃO, NENHUMA DIFICULDADE

6.15 - TEM DIFICULDADE PERMANENTE DE OUVIR?
( SE UTILIZA APARELHO AUDITIVO, FAÇA SUA AVALIAÇÃO QUANDO O ESTIVER UTILIZANDO)
1 - SIM, NÃO CONSEGUE DE MODO ALGUM 3 - SIM, ALGUMA DIFICULDADE
2 - SIM, GRANDE DIFICULDADE siga 6.16 4 - NÃO, NENHUMA DIFICULDADE

6.16 - TEM DIFICULDADE PERMANENTE DE CAMINHAR OU SUBIR DEGRAUS?
( SE UTILIZA PRÓTESE, BENGALA OU APARELHO AUXILIAR, FAÇA SUA AVALIAÇÃO QUANDO O ESTIVER UTILIZANDO)
1 - SIM, NÃO CONSEGUE DE MODO ALGUM 3 - SIM, ALGUMA DIFICULDADE
2 - SIM, GRANDE DIFICULDADE siga 6.17 4 - NÃO, NENHUMA DIFICULDADE

6.17 - TEM ALGUMA DEFICIÊNCIA MENTAL / INTELECTUAL PERMANENTE QUE LIMITE AS SUAS ATIVIDADES HABITUAIS, COMO
TRABALHAR, IR À ESCOLA, BRINCAR, ETC.?
1 - SIM 2 - NÃO



Leia também: Diálogos e História.

Um comentário:

  1. Amigo Amílcar, leio esta 2º parte de seu precioso texto com satisfação. Sou aqui novamente informado de fatos que demandaria horas de procura. Com a sua permissão e peço o mesma a Tuca Monteiro, vou repassar este aos meus amigos. Estou no aguardo da continuação. Abraços André

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